quinta-feira, novembro 04, 2004

BICHO-PAPÃO

Bastou amanhecer para que a criança sentisse o cheiro do perigo a rondar.

Farejou um pouco mais e descobriu suas formas.

O perigo é uma ave de rapina com sorriso de gato. Sua face sorridente oculta olhos vorazes e dentes fortes.

O aspecto doce não disfarça seu apetite selvagem por carnes tenras e lágrimas convulsas. Delicia-se quando nota o pavor, emanando o perfume enjoativo do medo.

A criança entende seu jogo: enxuga o orvalho da cara, engole o choro e desdenha de sua aparência medonha.

O perigo enfia o rabo entre as pernas, baixa as orelhas e dorme faminto.

O perigo, uma dia, vai morrer à míngua feito cão danado e sem dono, porque a criança vai crescer e descobrir que não existe bicho-papão.

4 comentários:

Anônimo disse...

Infelizmente, depois da morte do bicho-papão outros medos virão.
Marcos
www.esculachoesimpatia.zip.net

Lu disse...

Contanto que sejam nossos...

Alexandre disse...

não há coragem sem medo

Lu disse...

É isso aí, Alexandre... o equilíbrio vem dos contrários. Abraço.