ESCREVER. Enganos profundos, debates e impasses que provocam o desejo de “exprimir” o sentimento amoroso numa criação (notadamente de escritura).
4. querer escrever o amor é entender a desordem da linguagem: essa região tumultuada onde a linguagem é ao mesmo tempo demais e demasiadamente pouca, excessiva (pela expansão ilimitada do eu, pela submersão emotiva) e pobre (pelos códigos sobre os quais o amor a projeta e a nivela).
Relendo Fragmentos de um discurso amoroso do Roland Barthes, deparei-me no “verbete” ESCREVER. Refletindo um pouco e extrapolando os limites do discurso amoroso, sou capaz de generalizar que a necessidade de exprimir qualquer sentimento provoca o desejo da criação artística em suas mais diversas expressões e, no meu caso, o desejo é notadamente a de fiar escrituras.
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Era uma vez uma história de amor e como tal pretendia-se linda, plena de significados e sintaxe perfeita, mas uma história de amor é bem mais (ou seria bem menos?) do que escrever uma história de amor.
Durante dias labutou sobre o papel, enervou-se, rasgou palavras, esmiuçou verbos. Na lixeira, jaziam infinitas possibilidades de dizer eu-te-amo: nenhuma resultou ser convincente.
Então, respirou fundo e resolveu esperar pela inspiração como o amante que, sentado ao lado do telefone, aguarda – excitado, mas fingindo paciência – os toques estridentes. Após um tempo, como o telefone não toca, a angústia toma conta.
Cansou de esperar e tolerar atrasos.
Chorou copiosamente por pouquíssimos segundos. Limpou o nariz na manga da camisa, amassou o papel entre as mãos e que era pra ser uma história de amor virou vinagre.