quinta-feira, maio 27, 2010

"See you in another life, brotha"

Putz, tem tempo que não escrevo um post, pessoas.

Eu poderia elencar inúmeros motivos para este meu silêncio: excesso de trabalho, cansaço, falta de tempo, mas esses não são fatores determinantes.

Já escrevi posts enquanto me sentia cansada, chateada, deprimida, frustrada, puta da vida. Esses sentimentos nunca me impediram de “falar”.

Mas estou em algum lugar do tempo que não sei definir o que sinto, só sei de uma coisa: não tenho nada a dizer. Quando algo me provoca e penso: “vou escrever sobre isso”, tudo não passa de ímpeto. Tão logo eu começo a rascunhar as palavras no papel, o desejo passa, acho “mais do mesmo”, repetitivo, não acrescenta.

Pessoalmente, isso me angustia, porque denota aquele estado que chamo de TANTO FAZ (E eu não sou uma pessoa de esperas!).

Tanto faz falar ou não falar, escrever ou não escrever, denunciar ou não denunciar... Esse lugar chamado TANTO FAZ é um terreno movediço, perigoso, amorfo, é o espaço de quem perdeu a esperança, de quem desistiu de agir, porque no fim, não adianta, nada muda.

Por outro lado, no que se refere aos textos que aqui publico e se pretendem ‘literários’, o silêncio não me incomoda. Aprendi a respeitar os intervalos e os longos desertos criativos, porque escrever algo que clama alguma elaboração exige estudo, dedicação, leitura. Não acredito em inspiração apenas.

Mas ontem, depois de ver o último episódio de Lost, tive vontade de escrever umas bobagens aqui.


Eu acompanhei as duas primeiras temporadas da série. Achava aquela nova linguagem o máximo! O roteiro era impecável, os mistérios iam surgindo de maneira inteligente, prendendo a atenção e exercendo efeitos alucinóginos na audiência, de modo que era impossível não viajar nas teorias.

Na terceira temporada, comecei a ficar entediada e receosa pelo final e, então, comecei a “cabular aulas”.

Apesar de sempre ter ouvido e lido que os roteiristas já tinham um plano traçado, digamos assim, a planta baixa da série, sabendo quando e como acabaria, eu tinha certeza que não seria bem assim. Afinal, uma série que revolucionou a linguagem televisa, não ia se manter hermeticamente fechada à resposta da audiência.

Fui turista da quarta temporada, porque não me sentia mais tão motivada. O descarrilamento de Lost começou a me dar paura.

Antes de mais nada, eu sou homus literatus. Quando eu gosto demais de um livro e vejo que estou preste a terminar a leitura, começo a pisar no freio, fico adiando o final, porque vai batendo saudade das personagens e da narrativa bem construída.

Foi o que fiz em relação a Lost, comecei a ver de vez em quando, para não estragar a mágica de duas temporadas brilhantes.

Voltei a ser uma “lostie” na quinta temporada e esperei para ver o desfecho desta que foi a sexta e última.


Primeiro ponto: achei o final muito digno com as personagens. O fato de os roteiristas de Lost terem se perdido, não invalida a importância dessa série para os padrões de linguagem e mídia televisivas. Lost é incontestavelmente um marco no mundo do entretenimento e a série será sempre lembrada.


The End foi emocionante, cheia de epifanias redentoras e uma mensagem muito otimista no que se refere às relações humanas que construímos no decorrer de nossa existência.

E Lost tem um monte de outros detalhes que renderiam livros e mais livros: uma filosofia de aceitação da morte, a tomada de consciência de que as pessoas vivem isoladas, em suas ilhas pessoais. E não importa o quanto você fuja, a alternativa de quem escapa da ilha é o deserto – que é uma simbologia muito forte, e das mais antigas, para a representar a solidão e o embate do Homem com os seus demônios.

Agora vamos combinar: nem metade dos mistérios propostos foi respondida. E não vem com esse papo de que é a personagem que importa, os mistérios são secundários. Se fosse única e exclusivamente a personagem que importasse, então, não precisaria criar uma mítica, uma teoria matemática para explicar as viagens no tempo. Uma narrativa bem construída justifica a existência de personagens bem estruturadas.

Na cena final, o elenco foi reunido, mas alguém viu Mr. Eko no recinto?

Por que não foi permitida a Benjamin Linus, que sempre foi minha personagem preferida – eu tenho uma queda por vilões inteligentes –, uma redenção completa? O cara que deu a vida pela ilha foi excluído do processo de eleição do “candidato”.

Também não gostei do maniqueísmo estabelecido entre Jacob e o Homem de Preto. Por que Jacob era o Bem e o Homem de Preto, o Mal? A retomada da construção do discurso do anjo decaído não foi bem executada.

O que separou Caim de Abel foi a inveja; Lúcifer de Deus, a arrogância, a cobiça... mas o que separou Jacob do irmão, que não foi merecedor sequer de um nome?

O Homem de Preto queria ser livre, queria poder cruzar o oceano e conhecer outras realidades; ele queria ter o livre arbítrio de escolher não viver com a assassina de sua mãe. E por que Jacob foi sempre tão submisso? Por que aceitou tão bem o fato da morte da mãe e o convívio com sua assassina, mas jamais aceitou o desejo do irmão de ir além?

Isso não é apenas mistério. É, como diria Nietzsche, humano, demasiado humano.

A complexidade psicológica das personagens, construída ao longo de seis anos, foi substituída e subestimada pela aceitação e redenção, pura e simples, como se esse desfecho fosse a regra, a única trajetória possível do percurso humano.