terça-feira, março 08, 2005

Querida V.,

Desculpe a demora em respondê-la. Acho que somente hoje consegui sorver a última letra do seu discurso. Não houve um só dia que ele não me assaltasse, crispando minhas mãos até ficarem pálidas.

Devemos ser bastante cautelosos com esta senhora chamada Dor porque ela entranha, querida. Tal qual poeira. Ela procura pelos cantinhos mais difíceis e se instala, amarelando nossos sonhos, ressecando nossos olhos, engessando comportamentos.

Algumas vezes torna-se tão íntima que passamos a sofrer mais quando ela se ausenta de nossas vidas do que quando nos habita.

V., minha querida, nós também nos acostumamos à dor e, pior, tomamos gosto por ela. Passamos a fazer sua cama, colocar a mesa e dormir abraçados a ela.

Não esqueça de abrir janelas e cortinas, querida. Os cantinhos precisam ser arejados, senão a gente fica pairando em sombras.

Não sei como, mas é preciso encontrar motivos para despertar a cada manhã, se apegar nas pequenas alegrias. A dor, bem como a sufocação advinda dela é inevitável, V., mas fazê-la nossa companheira é uma escolha.

Espero que você escolha se despedaçar em luz porque daqui onde me encontro, eu vejo a luminosa incidência de raios.

Amor,
A.

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