terça-feira, maio 17, 2005

Correspondência

Querida V.,

Escuta-me com atenção. Não a mim, exatamente, mas às vozes vociferantes no meu corpo. Elas são tão ladinas que aprenderam a murmurar, V! Como numa sinfonia de orquestração perfeita: todas falam ao mesmo tempo sem confusão; existe harmonia porque eu consigo diferenciá-las. Sei reconhecê-las.

Meu corpo, essa praça pública, vibra e desfalece de acordo com a entonação do coro.

V., diga-me que não estou enlouquecendo, por favor! Se você estivesse aqui, provavelmente também ouviria.

Já sei o momento em que elas fazem festa; é o mesmo momento em que silencio, em que emudeço para o mundo e suas cores.

Cinema mudo, V., é o que eu tenho sido. Não emito sons, estou monocromática. O único exercício que tenho feito é o de decifrar lábios, imaginar as palavras, investigar sorrisos.

V., será que em algum lugar do mundo alguém silencia enquanto assiste ao meu filme?

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